De
onde estava sentado pôde ver os olhos da mulher tornarem-se repentinamente
úmidos. Notou o movimento sutil de sua garganta como se engolisse algo áspero,
percebeu que ela apertava com a mão esquerda os dedos da mão direita. Sentiu-se
incomodado quando a umidade dos olhos dela cresceu e vazou em grossas lágrimas
que percorreram lentas o rosto negro.
Olhou
em volta procurando mais alguém entre todas as pessoas que estavam no local que
assim como ele houvesse percebido a dor estampada naquele rosto sentado na mesa
logo a frente da sua, que fizesse algo que o eximisse de mover-se na direção
daquela desconhecida, ou ao menos partilhasse da culpa por omitir-se. Não
encontrou.
Aproximou-se
dela e lhe estendeu um lenço de papel. Ela olhou-o e aceitou o papel em silêncio.
Pressionou o papel sobre as pálpebras deixando-o com manchas escuras de
resíduos de maquiagem.
_Você
pode ficar aqui comigo?
Os
olhos negros brilhantes por causa do choro transformavam a pergunta em súplica,
que ele atendeu de pronto sentando-se ao lado dela. Não disseram nada e a
ausência de palavras causava um desconforto a ele, angustiava-se por não saber
se deveria ou não estabelecer uma conversa, pensava em coisas que gostaria de
perguntar-lhe para em seguida pensar na possibilidade de isso a constranger e
mantinha-se calado.
A
voz dela, limpa e baixa, retirou-lhe da angústia.
_Desculpa
pedir pra você ficar comigo...
_Você
não pediu. Você me perguntou se eu podia ficar.
Ela
sorriu, e o sorriso dela fez com que o peito dele ficasse mais leve desenhando
em seu rosto um sorriso também.
_Então
desculpa por chorar em público.
_Imagina,
nem foi assim um choro. Passava por um cisco no olho fácil.
Dessa
vez o rosto inteiro dela se abriu em um riso amplo e ele subitamente – como
alguém que de repente recebe dos céus uma revelação – enxergou nos traços dela
uma beleza exata, plena.
Ainda
com um resto de sorriso na face ela agradeceu.
_Obrigada,
eu normalmente sentiria vergonha por ter chorado assim, mas com você dizendo
que pareceu um cisco...
_Vergonha?
Não precisa se envergonhar isso é algo natural, todas as pessoas que eu conheço
certamente iriam verter lágrimas se tivessem que ler sobre física aristotélica
_disse pegando um dos livros que estavam em cima da mesa dela _ Eu mesmo sempre
vejo gente chorando aqui na biblioteca, por entre as prateleiras, tanto que
trago comigo lenços de papel...
Ela
dirigiu a ele um olhar incrédulo.
_Isso
e o fato de ser alérgico a poeira, sempre que venho aqui acabo precisando de
lenços.
_Bem
que havia ficado desconfiada dessa sua história de trazer lenços para secar as
lágrimas de estranhos na biblioteca.
Novamente
ficaram em silêncio, entreolharam-se, e nesse encontro calado de olhos havia
uma ternura mútua, secular.
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